Glauco Diniz Duarte Empresário – petroleo é energia renovavel
Segundo o Dr. Glauco Diniz Duarte, a geopolítica mundial atual, além de outros fatores, tem apresentado como característica uma relativa multipolaridade, em que pólos de crescimento contra hegemônicos vêm influenciando o ritmo das atividades econômicas sobre o planeta. E nesse cenário, a disputa pela base material energética é um dos aspectos que mais tem impulsionado o quadro político mundial de instabilidade e conflitos.
Dessa forma – e cada vez mais em perspectiva, já que o petróleo é escasso e finito –, o controle de fontes energéticas por parte dos novos pólos emergentes torna-se a principal garantia de consolidação dos Estados nacionais soberanos, sobretudo ao fortalecê-los como contra tendências ao hegemonismo norte-americano.
O mundo está sedento por mais energia
As atividades econômicas em todo o mundo, ao manter como matriz energética
prevalecente as fontes não-renováveis, e com forte preponderância do petróleo, impõem aos países um grande desafio por novas descobertas. A busca pelo seu domínio tem provocado inúmeros enfrentamentos bélicos patrocinados pelo dependente império estadunidense.
Ao mesmo tempo em que se intensifica a agonia em torno das fontes não-renováveis, cresce no mundo a corrida por fontes alternativas – as renováveis –, buscando fugir da dependência fóssil. Essa nova diretriz impõe-se em função da luta contra escassez, mas também motivada pelo positivo e crescente movimento de conscientização dos povos pela preservação ambiental do planeta, reafirmando-se atualmente como uma bandeira internacional do pensamento progressista mundial.
A disputa geopolítica hoje estabelecida no mundo e o conseqüente ritmo de suas
atividades econômicas vão determinando de forma mais nítida que o domínio sobre as fontes energéticas é parte integrante da agenda da segurança econômica e nacional, e como tal, deve ser conduzida como política de Estado, relativizando, portanto, que devam ser tratadas como meras commodities.
O Brasil é fonte da energia renovável e tem reservas não-renováveis
A localização geográfica do Brasil o coloca como um dos maiores retentores da maior fonte natural energética do planeta, o sol. Seu clima e sua grande disponibilidade de terra e água o vocaciona a tornar-se o grande produtor e dominador técnico-científico da produção de energia renovável.
As reservas de petróleo e gás do País – atualmente em 14 bilhões de barris de petróleo – devem acrescer-se de algo em torno de 40% a 60% com a recente descoberta fronteiriça da maior província petrolífera do Brasil, que se estende pelas Bacias de Espírito Santo, Campos e Santos. A isto deve se somar algo em torno de 350 bilhões de m3 de gás – o que pode constituir patamar de relativo conforto também nas fontes não renováveis.
Comprovamos a realidade desse potencial, sobretudo na condição do País de diversificar, de forma sustentável, as fontes da configuração atual de sua matriz energética. Atualmente esse patrimônio leva o Brasil a constituir-se como a grande potência energética no mundo, se credenciando como país de ponta na produção energética a partir da biomassa.
Os não-renováveis
O Brasil ainda está dependente de forma preponderante das
fontes não-renováveis, pois 55,30% da matriz nacional advêm delas, e em especial do petróleo. Mesmo assim, este é um percentual menor em comparação ao quadro mundial.
As reservas brasileiras de petróleo e gás, acima citadas, devem nos colocar, em breve, na condição de grande produtor mundial de petróleo. Uma conquista que, ao propiciar relativa auto-suficiência, deverá permitir a expansão da capacidade produtiva e impulsionar o desenvolvimento nacional, atuando como indutora de nossa economia.
A fragilidade atual do Brasil está em sua incapacidade momentânea de atender a todas as demandas de gás. A participação do gás natural na oferta interna de energia era de 7,7% em 2003, devendo chegar a 15% em 2015, respondendo a uma elevação de demanda que cresce a 10% a.a. nos últimos anos.
Esse ritmo obedece a uma diversificação necessária em nossa matriz energética no campo dos fósseis menos poluentes, mas, sobretudo, origina-se na crise energética produzida pela era FHC em 2001, com o “apagão”. A gestão neoliberal conduziu um ambicioso e escuso projeto de geração de energia a partir do gás natural, no qual estimulou a construção de duas dezenas de térmicas. Hoje, contamos com um parque de 26 (o projeto original de FHC era de 49), e isso nos levou ao aumento do consumo do gás natural em 67%, entre 2000 e 2003.
O governo neoliberal exigiu que a modalidade contratual adotada pela Petrobras para aqueles empreendimentos garantisse o pagamento mensal, mesmo quando essas térmicas não funcionassem. Foi um prejuízo aos cofres da empresa em torno de U$ 1,5 bilhão, obrigando a estatal a parar com essa sangria e tornar-se majoritária no negócio.
Em estudo recente, contabilizou-se que se as 26 usinas forem acionadas
simultaneamente, consumiriam 46 milhões de m3/dia de gás natural. Sem essas usinas, o Brasil consome hoje 34 milhões de m3/dia.
Outra fragilidade estratégica decorrente da política anterior foi a dependência
exclusiva de uma única fonte abastecedora: a Bolívia. Interesses “não republicanos” na construção do gasoduto Brasil-Bolívia contribuíram para essa decisão.
Objetivando a superação dessa situação, o atual governo, através da Petrobras,
constituiu o PLANGAS (Programa de Antecipação de Produção de Gás Nacional), que prevê bilhões de dólares em investimentos estratégicos. A recém descoberta em Santos tende também, em médio prazo, a corrigir a atual desproporção entre o
consumo e a oferta.
O petróleo e seus marcos regulatórios
A constatação de que o emprego de 86,7% das fontes não-renováveis pelo
mundo e, destes, 56,20% advêm de petróleo e gás – e no Brasil, essas mesmas fontes correspondem a 47,7% dos 55,30% dos não-renováveis – nos obriga a analisar o controle e o domínio desses bens finitos com maior rigor.
O recente anúncio da aferição, somente na acumulação de Tupi, dentro da maior
província petrolífera descoberta no Brasil, além de elevar o tamanho de nossas
reservas, consolida no mundo a capacidade técnico-científica de nosso país, pois até hoje somente a Petrobrás conseguiu atravessar uma camada de sal com 2000m, chegando a uma nova fronteira exploratória: a camada geológica denominada pré-sal.
Nossas reservas de 14 bilhões de barris estão quase totalmente situadas acima
(camada pós-sal). A extensão da camada do pré-sal descoberta parte do estado do Espírito Santo até o de Santa Catarina, com uma extensão de 800 km e uma largura de 200 km.
Decorrente desse acontecimento, acrescente-se aos ganhos técnico-científicogeológicos – por si só já imensos –, a oportunidade de pautar, em um outro patamar, o debate sobre o marco regulatório das atividades petrolíferas no Brasil. Para mim, através de dados aqui já revelados, o debate não deveria se desenvolver somente percorrendo a história dessa atividade no Brasil e/ou no mundo, ou a luz apenas de seu ritmo e da sua pujança produtiva atual. Considero central para quem recai o controle e o domínio dessa fonte esgotável, que ainda faz o mundo dele depender para poder funcionar.
Dessa forma, não considero o petróleo uma simples mercadoria, mas uma fonte
estratégica sobre a qual o Estado deve exercer forte controle e domínio. As
modificações ocorridas em suas legislações obedeceram mais a uma correlação de força desfavorável em favor dessa concepção (embora hoje já em recuperação na América Latina), do que a uma alteração conceitual de que o petróleo não exerça mais a centralidade econômica para a consolidação das nações soberanas. Limitação financeira para investimento e dependência tecnológica específica influenciam também algumas flexões.
Não devemos correr riscos sobre o controle de nossas reservas energéticas, sobretudo as não-renováveis. Imaginem o impacto que teríamos caso a província recém descoberta pela Petrobrás tivesse sido leiloada e repassada ao controle estrangeiro.
Para mim, esta é a hora para uma grande reflexão coletiva.
O Brasil e as fontes renováveis: vocação pela biomassa
Nosso país emprega 44,7% de fontes renováveis em sua matriz energética. Esse valor nos coloca em posição diferenciada, quantitativa e qualitativamente, no panorama mundial. Com a crise energética já vislumbrada pelo mundo, os olhares – inclusive dos países desenvolvidos – voltam-se para esse enorme potencial natural brasileiro.
Nosso parque hidráulico, mesmo influenciado pela sazonalidade, nos dá grande segurança na obtenção de energia barata e limpa. Ainda nessa modalidade, com previsão de crescimento no mercado mundial a uma taxa de 15% ao ano, contamos até mesmo com o potencial de desenvolvimento da energia eólica que, por intermédio da Petrobrás, possui um projeto-piloto na cidade de Macau-RN, além do grupo Neo Energia, que já explora comercialmente, também no estado potiguar, essa fontealternativa.
Os recentes anúncios de investimentos previstos no PAC também, corretamente, vêm na direção de fomentar a participação da fonte nuclear em nossa matriz energética, buscando posicionar o país nos patamares do padrão internacional. Mas é na produção de biocombustíveis que reside nossa maior potencialidade alternativa aos insumos não-renováveis, colocando o país, em perspectiva, como grande produtor e exportador, além de seu domínio tecnológico.
O Pró-álcool é um programa brasileiro de sucesso que utiliza matéria-prima, tecnologia, equipamentos e infra-estrutura totalmente nacionais, e que fez do Brasil um pioneiro em retirar o chumbo da gasolina. Essa primazia está atraindo interesses internacionais, pois além de o país ser o maior produtor mundial, tem as melhores condições para sua manutenção e ampliação. Não por acaso, os Estados Unidos buscaram parceria para tentar interferir nesse processo.
Por meio da Petrobrás, o país já entra na segunda geração de biocombustíveis: o bioetanol. Este programa, desenvolvido na unidade experimental do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento da Petrobrás (CENPES), produz o etanol a partir de resíduos agroindustriais, utilizando bagaço de cana-de-açúcar, por ser o resíduo agroindustrial mais expressivo no país. Já o biodiesel é um dos programas com maior potencial pela capacidade de inclusão social, além de sua importante contribuição à diversificação de nossa matriz energética e ao impulsionamento da atividade econômica em regiões menos desenvolvidas.
Logo após o anúncio sobre a acumulação petrolífera de Tupi, o presidente Lula reafirmou sua firme determinação em prosseguir investindo no biodiesel. Já temos 40 usinas produzindo 1,640 bilhões de litros de biodiesel por ano, 21 unidades em processo de autorização e mais seis usinas em construção.
Os programas de biocombustíveis em desenvolvimento no Brasil colocam o país em condições de integrar-se de forma soberana no seleto grupo de nações que também já investem pesadamente nessa fonte energética alternativa. Estados Unidos, China e União Européia preparam-se para, em curto prazo, utilizar, em proporções consideráveis, os biocombustíveis como insumo em seus próprios meios de transportes.
Quem dirige e quem controla
Diante da crise que o mundo atravessa, decorrente em grande parte da escassez de insumos energéticos, o Brasil, com seu enorme potencial de recursos naturais, além de suas reservas de não-renováveis, é um grande emergente que precisa exercer um forte protagonismo na disputa pelas fontes alternativas renováveis no mundo. Concluo, afirmando precisarmos garantir a manutenção da rota percorrida pelo Brasil, mas não como simples política de governo. Mais do que isso. Precisamos assegurar que esses programas e projetos sejam elevados à categoria de contínua política de Estado.
Nesse sentido, a execução de tal política não deveria ficar restrita a uma diretoria de uma empresa estatal que necessita de reformulação ou a eventuais parcerias. É necessário que o Comitê Nacional de Política Energética (CNPE) rediscuta a estrutura atual da Petrobrás e fortaleça o seu sistema, colocando-o em condições de desenvolver, em patamar mais elevado, a luta estratégica por fontes energéticas renováveis.